IA na esfera ESG e a relevância para as iniciativas corporativas

IA na esfera ESG e a relevância para as iniciativas corporativas
O ChatGPT é a febre do momento. Ele interage através de diálogos e tem impressionado pela eficiência na criação de documentos.

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O assunto do momento é, sem dúvida, o ChatGPT[1]. O modelo de linguagem baseado em Inteligência Artificial (IA), que interage por meio de diálogos, tem impressionado pela eficiência na criação de documentos, organização de cronogramas e até aprovação em provas, como o BAR (American Bar Association), o exame de ordem para advogados nos Estados Unidos. A ferramenta levantou diversas discussões e uma maior consciência das pessoas sobre o emprego de Inteligência Artificial no dia a dia. Mesmo que a tecnologia em si já exista desde meados do século passado, ainda causa desconfianças sobre suas aplicabilidades.

O uso de IA confronta a sociedade em inúmeras questões éticas e legais, que incluem temáticas de privacidade e vigilância, preconceito ou discriminação, falta de transparência algorítmica e incertezas quanto à limitação de responsabilidade. O cenário de imprecisões, no entanto, divide espaço com um encanto pelas inúmeras possibilidades que inaugura.

Na esfera ESG, empresas podem usufruir de um poder, até então inédito, para coleta, categorização, atualização em tempo real e análise de seus dados. Um estudo global da Oracle ESG[2] aponta que 91% dos líderes empresariais enfrentam desafios para progredir em iniciativas de sustentabilidade devido às dificuldades para encontrar os dados necessários para acompanhar métricas e auferir progressos.

Muitos dos dados que precisam ser coletados não estão organizados ou são provenientes de múltiplas fontes, incluindo não apenas uma empresa, mas toda uma cadeia de fornecedores. Além disso, um problema significativo com os relatórios de práticas é a natureza inconsistente das estruturas ESG nas organizações, dado que, por exemplo, termos como sustentabilidade e diversidade podem significar algo completamente diferente para cada empresa. A grande variedade de estruturas dentro de cada setor torna ainda mais complexo o processo de comparar progressos e definir padrões nos setores. Neste ponto, o uso de Inteligência Artificial torna-se cada vez mais parte da estratégia ESG. A IA pode ajudar a gerenciar dados, ordenar informações, gerar insights, criar relatórios e operacionalizar estratégias.

Atualmente, a análise de dados em escala é limitada pela descentralização das informações ESG. O processo, por exemplo, de estruturar um relatório de sustentabilidade passa por uma série de etapas manuais, como a identificação e o acesso a relatórios individuais, extração de textos e higienização de bases de dados, antes mesmo que qualquer análise possa ser realizada.

De acordo com um levantamento feito pela BlackRock[3], ainda que a maioria das empresas S&P[4] reporte métricas ESG, 53% dos entrevistados citaram “má qualidade ou disponibilidade de dados e análises ESG” e outros 33% citaram “má qualidade de relatórios de investimento em sustentabilidade” como as duas maiores barreiras para a adoção de investimentos sustentáveis.

O uso de aplicativos de IA, aprimorado por uma nova geração de algoritmos de Machine Learning e computação em nuvem, levou recentemente às inovações na análise de dados de texto não estruturados em grande escala, por meio do uso de técnicas de Processamento de Linguagem Natural (PLN)[5]. Esse tipo de tecnologia permite uma análise de dados rápida, abrangente e em escala.

Uma vez organizados, os dados são estruturados e podem ser analisados para obter melhor compreensão sobre riscos ESG, como identificar riscos ambientais, direcionar recursos e capacidade técnica, definir prioridades, desenvolver medidas de mitigação, atender às metas da gestão e definir o escopo de um programa de engajamento.

Um exemplo já existente é o esgNLP, um modelo de processamento de linguagem natural, treinado pela International Finance Corpotaration (IFC) usando o Google BERT[6]. O esgNLP está condicionado a identificar quase 1.200 termos sobre riscos ESG em textos e classificar as frases em que aparecem, com base em sentimentos positivos, negativos e neutros. Termos como inclusão, transparência e comunidade são percebidos como positivos, enquanto poluição do ar, saúde ocupacional e desigualdade de gênero são vistos como negativos[7]. Com base nos termos levantados e nos sentimentos detectados, é possível criar análises e insights sobre dados não estruturados, com economia de custo e tempo.

Deve-se atentar no uso de modelos PLN para a garantia de transparência e de que os dados disponíveis para treinamento de modelo ou para criação de inferência sejam representativos da população estudada, garantindo a diversidade de fontes de dados, rastreabilidade de dados geográficos e setoriais e assegurar dados de alta qualidade.

A melhor maneira de termos uma ideia realista sobre o desempenho do ChatGPT é analisando a precisão do conteúdo de suas respostas para questões formuladas. Pergunta 1: Você acha que há má qualidade ou disponibilidade de dados e análises ESG? Resposta: Não há uma única resposta para essa pergunta, pois a qualidade e disponibilidade de dados e análises ESG variam amplamente entre diferentes empresas e setores. Algumas empresas fornecem informações detalhadas e atualizadas sobre suas práticas e desempenho ESG, enquanto outras oferecem pouca ou nenhuma informação. Além disso, a qualidade das análises ESG também varia, e é importante fazer uma avaliação cuidadosa e crítica dos dados e informações disponíveis. No geral, no entanto, a conscientização e a importância crescentes da ESG têm levado a uma melhoria na disponibilidade e qualidade de dados e análises nesse campo.

A Pergunta 2 foi sobre como a IA pode ajudar na melhoria desses dados e análises ESG. Resposta: A inteligência artificial pode ajudar a melhorar a qualidade e a disponibilidade de dados e análises ESG de várias maneiras: 1. Coleta de dados: Algoritmos de aprendizado de máquina podem ser usados para coletar e processar grandes quantidades de dados ESG de fontes diversas, como relatórios financeiros, notícias e meios de comunicação social. 2. Análise de dados: A IA pode ser usada para analisar os dados coletados e identificar padrões e tendências relevantes. Por exemplo, os modelos de aprendizado de máquina podem ser treinados para prever o desempenho ESG futuro de uma empresa com base em suas práticas e desempenho passados. 3. Monitoramento: Os algoritmos de IA podem ser usados para monitorar continuamente o desempenho ESG de uma empresa e alertar os usuários sobre mudanças significativas. 4. Melhoria da transparência: A IA pode ser usada para tornar mais fácil e acessível para os investidores acessar e compreender informações ESG relevantes sobre as empresas em que estão considerando investir.

O resumo que o ChatGPT fez é pertinente, ao afirmar que a “ IA pode ser uma ferramenta valiosa para melhorar a qualidade e disponibilidade de dados e análises ESG, ajudando a promover decisões de investimento mais informadas e responsáveis”.

Um outro quadro que abre um espaço cada vez mais significativo para a análise de dados de maneira objetiva e confiável é o dos investimentos sustentáveis. Com o advento, principalmente, das mudanças climáticas, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas tornaram-se um novo paradigma inevitável. Os investimentos em conformidade com os ODS têm o potencial de remodelar setores inteiros e impactar positivamente o desenvolvimento de corporações, economias e sociedades em direção a maior sustentabilidade.

Dados ESG de alta qualidade tornaram-se muito valiosos nos últimos anos, em especial devido às regras impostas pelos reguladores financeiros dos Estados Unidos e da União Europeia, que impuseram  dispositivos estritas de relatórios aos gestores de ativos, com o objetivo de minimizar o risco de greenwashing, a prática de organizações de promover discursos e ações ditas sustentáveis, mas que não são realmente adotadas. Em Singapura, por exemplo, bancos terão que passar por um teste de estresse. A Autoridade Monetária de Singapura empregará IA e métodos de verificação de dados para que a proveniência de investimentos verdes possa ser atestada.

Nas próprias iniciativas corporativas de ESG, a IA tem um papel de crescente relevância. Na esfera ambiental, as empresas podem aplicar ferramentas de IA para cumprir critérios ambientais em seus modelos de negócios, como aumentar a eficiência energética nas operações, ao adotar redes inteligentes que aproveitam a análise de dados em tempo real para garantir a demanda e o fornecimento de energia. De fato, com redes mais complexas coletando energia de diferentes fontes, não renováveis ​​e renováveis, a IA pode analisar conjuntos de dados massivos, melhorando o gerenciamento dessas fontes.

De forma similar, ferramentas de IA podem apoiar no controle da poluição e do gerenciamento de resíduos. Na agricultura e na indústria alimentícia, as perdas pós-colheita e o desperdício de alimentos são dois dos principais problemas na gestão da cadeia de abastecimento e logística. Uma aplicação é a de dispositivos inteligentes baseados em tecnologias de sensores que permitem a automatização do envio e da entrega de mercadorias, monitorando e prevendo a perecibilidade da carga. Além disso, as informações auxiliam os profissionais de cadeia de suprimentos quanto à alteração de preço da carga ou momento de envio das cargas, possibilitando o corte de custos logísticos e tempo.


[1] Disponível em: ChatGPT: Optimizing Language Models for Dialogue (openai.com)

[2] Disponível em: Sustainability and AI | Oracle

[3] Disponível em: blackrock-sustainability-survey.pdf (lalr.co)

[4] S&P: O Índice S&P 500 é um índice de mercado criado pela S&P Dow Jones Indices e que representa o desempenho médio das ações de empresas americanas de maior capitalização negociadas nas bolsas dos EUA.

[5] PLN: O processamento de linguagem natural (PLN) é um ramo da linguagem artificial inteligência, que faz uso de recursos de computação que podem compreender a maneira como os humanos aprendem e usam a linguagem.

[6] Google BERT: Google BERT é um algoritmo e acrônimo para Bidirectional Encoder Representations from Transformes. Baseado em inteligência artificial, ele é capaz de traduzir a linguagem humana para os computadores e permite que o Google entenda o que as pessoas estão buscando.

[7] Disponível em: Artificial Intelligence Solutions to Support Environmental, Social, and Governance Integration in Emerging Markets (ifc.org)


LORENA CARNEIRO – Sócia da Lee, Brock, Camargo Advogados, LLM em Direito Societário e Mercados de Capitais pela FGV-RJ e cursando MBA em Gestão de Negócios, Inovação e Empreendedorismo pela FIA
KRISTIAN LEE – B.Sc. in Economics and Business Administration e Computer Science Student, ambos pela Goethe Universität Frankfurt Am Main, e Senior Business Analyst na Warren Brasil.