O futebol, como um fenômeno social profundamente enraizado em nossa cultura, desempenha um papel fundamental que vai além das quatro linhas do campo, estendendo-se às esferas da sociedade, da família e até mesmo da economia, afinal, é responsável por quase 1% do PIB nacional. Sua indiscutível força e influência o colocam em uma posição única para ser um veículo de disseminação das práticas de ESG (Environmental, Social and Governance) em todas as camadas sociais. No entanto, para que esse potencial transformador seja plenamente alcançado é essencial ampliar as ações dos clubes em prol da criação dessas práticas como um valor cultural, abordando questões interconectadas que ultrapassam o espetáculo esportivo.
No contexto ambiental, é decisivo que a sustentabilidade e a gestão ambiental se tornem elementos naturais ao planejamento estratégico dos clubes de futebol. A implementação de práticas de ESG não apenas contribui para a redução do impacto ambiental, mas também pode representar uma oportunidade para essas instituições se tornarem líderes em ecoeficiência. A instalação de painéis solares, sistemas de reciclagem de água e a adoção de iluminação LED de baixo consumo nos centros de treinamento e estádios de futebol são apenas alguns exemplos de medidas que podem ser tomadas.
Além disso, os clubes e torcidas organizadas estão cada vez mais engajados em práticas sustentáveis, como a redução do uso de plástico e o estímulo ao uso de transporte público para os jogos. Um exemplo notável é o Coritiba, que se destacou por ser o primeiro clube brasileiro a aderir ao Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), demonstrando um compromisso genuíno com a causa ambiental.
Quando um clube utiliza a sua influência para motivar um público mais vasto sobre questões ambientais, de sustentabilidade e de alterações climáticas, isso também tem demonstrado benefícios adicionais para o próprio clube. Empresas com uma forte estratégia ESG apresentam maiores retornos financeiros e menos riscos.
No que diz respeito ao aspecto social, os clubes de futebol no Brasil possuem um histórico de contribuições que marcaram a história do esporte nacional e trouxeram importantes mudanças para a sociedade. Destaque-se a postura adotada por clubes como Vasco, que em 1904 abriu suas portas para jogadores negros, desempenhando um papel fundamental na quebra de barreiras raciais, assim como o time de futebol feminino criado pelo Flamengo, ainda na década de 1950, ajudou a popularizar o esporte entre as mulheres e inspirou outros clubes a criarem suas próprias equipes.
Esses clubes, atualmente, estão intensificando seus esforços para promover a igualdade de gênero e a diversidade racial, ao mesmo tempo em que investem em programas direcionados às comunidades carentes. Os times femininos estão recebendo cada vez mais visibilidade em competições e campeonatos exclusivos, contribuindo para uma maior equidade de gênero no esporte. Além disso, é importante ressaltar que muitos jogadores têm aproveitado sua notoriedade para apoiar causas sociais, como a luta contra o racismo e a discriminação.
No entanto, é inegável que casos como o recente incidente envolvendo o jogador Vinicius Jr., vítima de racismo por torcedores europeus, destacam a urgência de adotar medidas efetivas para combater o racismo no esporte. Assim, é vital que os clubes e entidades esportivas assumam um compromisso sólido com a promoção da igualdade racial, implementando políticas que combatam o racismo e a discriminação em todas as suas formas. Todos os jogadores e torcedores, independentemente de sua cor de pele, devem ser tratados com dignidade e respeito em um ambiente inclusivo e livre de preconceitos.
No âmbito da governança, reconhecer o poder de influência que os clubes de futebol detêm sobre a opinião pública configura uma prioridade. Independentemente de sua localização geográfica, essas instituições esportivas contam com a fervorosa paixão de seus torcedores, que acompanham atentamente cada movimentação dos dirigentes. Nesse contexto, a criação de comitês de ética e a divulgação transparente de informações financeiras tornam-se medidas de grande interesse, não apenas para os torcedores, mas também para toda a sociedade.
Uma das crises mais comuns que ocorrem na governança do futebol é quando um clube enfrenta problemas de má gestão financeira e luta para pagar suas dívidas, principalmente porque os clubes de futebol possuem uma peculiaridade única, pois são empresas privadas que não buscam somente os lucros. Em vez disso, priorizam o desempenho esportivo, muitas vezes em detrimento do desempenho financeiro. Nesse cenário, percebe-se a importância da governança adequada para garantir a proteção dos clubes de futebol contra a má gestão. Uma boa gestão afeta positivamente os torcedores, evitando, inclusive, cobranças radicais que resultem em vandalismo, depredação e ações degradantes para a sociedade e meio ambiente causadas pelo fanatismo radical.
Portanto, o futebol possui um enorme potencial para disseminar as práticas ESG e se tornar um agente catalisador de mudanças positivas em nossa sociedade. Ao adotar ações sustentáveis, inclusivas e transparentes, o esporte se alinha aos valores da sociedade moderna e cumpre sua missão de liderança e promoção da transformação. Agora é o momento para os clubes e entidades esportivas abraçarem integralmente as práticas ESG, tornando-se verdadeiros modelos a serem seguidos na jornada rumo a um futuro mais sustentável e igualitário.
Autora: Rayanne Conceição de Almeida Santos